Este texto foi escrito em parceira com André Cherubini Alves, professor doutor da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo (EAESP/FGV-SP).
No último mês de julho aconteceu, entre Campinas e São Paulo, o Simpósio InSySpo 2019. O evento anual sobre inovação e desenvolvimento, que é organizado pela Unicamp, pela George Washington University e pela FAPESP e que conta com a presença de vários pesquisadores nacionais e internacionais, é a chance para a gente trocar ideias em outra esfera!
Neste ano, foram discutidas alternativas de política e gestão estratégica para a inovação em torno do tema “construção de capacidades, upgrade tecnológico e catching-up com os países desenvolvidos”. Na ordem inversa — até para que se possa entender o mecanismo por trás da sopa de letrinhas — para alcançar (catch-up) os níveis de desenvolvimento de países líderes mundiais é necessário fazer evoluir o padrão de conhecimento e tecnologia em circulação na economia para níveis mínimos de produção e transação (upgrading). Só que isso não se faz por decreto. A chave está no aproveitamento da vocação produtiva preexistente e no uso da estrutura de ciência e tecnologia para construir sólidas capacidades de inovação nas empresas (building capabilities).
O problema é que os exemplos clássicos de catching-up de inovação são sempre os mesmos. Pelo lado da inovação, os exemplos são o Vale do Silício, Boston, Israel e, mais recentemente, a China. Pelo lado do catching-up, os históricos exemplos de Japão, Coréia do Sul e Singapura. Mais recentemente, novamente, a China também é exemplo de catching-up tecnológico por meio da estratégia de papel proeminente do Governo e escolha dos setores e empresas campeãs nacionais.
Isso tem levado formadores de Políticas Públicas do Brasil frequentemente a tentarem buscar se espelhar nesses modelos. A última experiência mal sucedida foi a do Setor de Construção Naval que decolou subitamente e logo sucumbiu às fricções de falta de coordenação entre política, cadeia de fornecedores e empresas. Isso ocorreu pois é impossível replicar uma política de países que são culturalmente diferentes. Se de um lado a Coréia do Sul se beneficiou de um momento histórico pós segunda-guerra contando com o forte apoio dos EUA como mercado dos seus produtos, a China conta hoje com uma estrutura de governo relativamente estável de longo prazo, porém não necessariamente democrática.
Após mais de dez anos de tentativas de replicar políticas desenvolvimentistas relativamente fechada “à la modelo Asiático”, o Brasil está buscando se abrir, realizando reformas que dinamizem os negócios com o mundo. Após a vitória da primeira grande batalha (a reforma da previdência), os mercados dão sinais de que uma “onda” positiva se aproxima e o país precisará saber “surfá-la”.
Porém, o país não pode incorrer no erro de “imitar” outros países! O Brasil precisa trilhar o seu próprio caminho e talvez o melhor benchmark seja o próprio Brasil, naquilo que temos de mais positivo. Em linguagem mais simples ainda: se quisermos (ou se conseguíssemos) surfar essa “onda positiva” (acordo com UE, bolsa, rapidíssimo início de aprovação da reforma, etc) com uma bela “prancha” (technological upgrading) e um bom “estilo” (building capabilities), aí rola catch-up!
O Brasil ficou conhecido como o País do Futebol pelo seu jeito inovador de jogar e formação de grandes e criativos talentos. Como? Uma mistura de talento e investimento nas categorias de base por parte dos clubes e patrocinadores. Esse tempo parece ter passado com a “europeização” do futebol Brasileiro, o que é uma pena. Hoje, o país está despontando em outro esporte: o Surf! O país com um dos maiores territórios litorâneos do mundo (e não necessariamente as melhores ondas), após anos de hegemonia americana e australiana, desponta como o país do Surf com uma nova geração de surfistas que inventaram um jeito totalmente novo de surfar, ganhando 3 títulos mundiais em 5 anos! Essa geração, conhecida como “the Brazilian Storm” (com Gabriel Medina, Filipe Toledo, Adriano de Souza, Miguel Pupo, Ítalo Ferreira) já nasce falando inglês fluentemente e abre os olhos do mundo para um país de potencial incrível chamado Brasil. Ah, e isso sem falar das meninas também (como Tatiana Weston-Webb, Silvana Lima e Tainá Hinckle)!
Portanto, voltando para a Economia, é preciso colocar o recurso na base e permitir que a criatividade e espontaneidade das vocações nacionais apareçam. O país tem muitos empreendedores com talento e resiliência. Além disso, o nosso agronegócio é cada vez mais tech! Só precisa avisar o governo que tem que despejar recursos para comprar “pranchas novas” e pagar “umas surf trips” para treinar os meninos e meninas da base, sabe?
O Brasil está deixando de ser o país do futebol e virando o país do Surf! O futebol é aquele negócio que já foi uma startup nos tempos do Pelé e precisa se renovar. Vamos deixar de ser o país das commodities com foco em custo e preços baixos (que só vai piorar a renda) para nos transformar no país do valor agregado, o high-tech do low-tech; o país dos produtos agro premium, da indústria de nicho, da digitalização dos serviços… Aí, finalmente, entraremos no século XXI. Sem “tow-in” (aquele jet sky “governamental” que puxa os surfistas para entrar nas ondas grandes), mas na braçada e no estilo!
Assim como o Brazilian Storm, é preciso colocar recursos na base (empresas e instituições de C&T) se realmente quisermos ter algo sólido e duradouro para daqui alguns anos.
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Você acha que o Brasil tem o que é necessário para “surfar” nessa nova onda? Deixe seu comentário abaixo.